Operário de uma fábrica de óleo industrial e automotivo de segunda a sexta-feira e cantor aos finais de semana, Marcos Hatano, 43, foi a principal atração daquela noite no Muvuka's. No Japão desde 1990, ele cresceu ouvindo sertanejo em Mogi das Cruzes (SP), sua cidade natal, por influência de sua mãe. Começou a cantar entre amigos na adolescência e, já no Japão, subiu a um palco pela primeira vez por brincadeira, há nove anos, incentivado por um amigo.
Desde então, ou a receber convites e não parou mais: canta em Handa e em outras cidades com grande concentração de brasileiros, como Hamamatsu, na província de Shizuoka, Oizumi (Gunma), Suzuka (Mie), Konan (Shiga) e Echizen (Fukui). Em 2007, participou do concurso de calouros Latino Nodojiman, realizado pela emissora de TV japonesa NHK e, entre mais de mil inscritos, ficou em segundo lugar.
Hatano gosta das duplas que fizeram sucesso nos anos 1980 e 1990, como Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo e Zezé Di Camargo & Luciano. As duas últimas já se apresentaram no Japão em 1997 e 2004, respectivamente, mas, devido ao trabalho, o paulista não pôde prestigiá-las. Até hoje, ele faz covers, com um repertório atualizado de acordo com os sucessos do momento no Brasil. Incluiu nomes como Zé Neto & Cristiano, Jorge & Mateus, Henrique & Juliano, Michel Teló.
"A música ajuda a amenizar as saudades e a relembrar muitas coisas da terrinha", afirma o cantor, que ou a maior parte da vida no Japão e só retornou ao país natal uma única vez, há 24 anos. "Os eventos são uma válvula de escape, a maneira que os brasileiros têm para descontrair e aliviar o estresse acumulado durante a semana."
"Muitos brasileiros são solitários, estão há muito tempo longe dos familiares e, praticamente, só vivem para trabalhar. A música acaba sendo um conforto emocional", endossa Cesar Valentim, 42, outro cantor dekassegui que investe no segmento do sertanejo universitário. Em 2021, ele lançou seu primeiro CD, "Última Dose", e já produziu seis videoclipes. Assim como Hatano, também subiu ao palco pela primeira vez de forma despretensiosa, há sete anos. Hoje, possui repertório próprio, com canções compostas por amigos músicos ou compradas de compositores que estão no Brasil.
Viver exclusivamente da música no Japão ainda é um sonho perseguido pelos sertanejos dekasseguis, que enfrentam jornadas de até 12 horas por dia como operários, assim como a maioria do público que frequenta seus shows. Os cantores entendem que, para ter sucesso a ponto de viver da arte, precisariam voltar ao Brasil, pois consideram o público limitado no Japão. Por ora, parte deles leva a atividade apenas como atempo e fonte de uma pequena renda extra.
"Vivo esse mesmo dia a dia desgastante e sei como é difícil", acrescenta Valentim, natural de Sorocaba (SP), que está há oito anos no Japão e trabalha de 8 a 12 horas por dia em uma fábrica de autopeças. "Entendo bem os dramas dos dekasseguis e essa afinidade nos aproxima. Frequentadores e organizadores das festas se conhecem bem, todos viramos amigos."